Instituto Ventura fala à Revista Página 22 da Fundação Getúlio Vargas sobre financiamento socioambiental e a parceria de sucesso com a Inaceres.
Financiamento socioambiental
por JOSÉ ALBERTO GONÇALVES PEREIRA
Entrevista com Rachel Botelho, coordenadora de operações, explica como a entidade dá uma segunda chance ao pequeno produtor inadimplente
Em uma época de intensa exposição, exacerbada pelos meios digitais, um grupo de investidores do Rio de Janeiro preferiu o anonimato quanto a seu apoio a uma iniciativa inovadora de financiamento a empreendimentos com impactos socioambientais positivos.
Com metas e indicadores para os projetos apoiados, o Instituto Ventura, fundado em 2009, dá uma segunda chance ao pequeno produtor inadimplente, às vezes porque deixou de pagar prestações de uma compra. Quem conta a Página22 como funciona o jovem instituto é a economista Rachael Botelho, coordenadora de operações da entidade.
No que o Instituto Ventura distingue-se
de outras iniciativas de financiamento a pequenos empreendimentos com impacto socioambiental positivo?
Nosso diferencial está na metodologia de gestão por resultados na qual se insere o tripé financiamento, assistência técnica e fortalecimento institucional. Fornecemos acesso a capital com valor médio de R$
100 mil por projeto para empresas e organizações sociais de comprovado impacto ambiental positivo. Ao prestar assistência técnica, também participamos de decisões estratégicas da instituição apoiada. E, ainda, a fim de deixar um legado de fortalecimento institucional, estabelecemos indicadores e metas para acompanhamento do projeto.
O instituto trabalha com desembolsos atrelados ao desempenho do projeto. Pode explicar melhor como isso funciona?
Se financiamos um projeto de R$ 100 mil, provavelmente faremos quatro desembolsos trimestrais de R$ 25 mil ao longo de um ano. Ao fim de cada período, avaliamos as metas e definimos, em conjunto, possíveis ajustes aos desembolsos.
Pode mencionar exemplos de sucesso nas atividades apoiadas pelo Ventura?
O Ventura possui dois modelos de financiamento: investimento direto, destinado a pequenas empresas verdes, e o fundo compartilhado, que beneficia cooperativas e associações de pequenos produtores. Apoiamos, por exemplo, a Lumen, que negocia alimentos orgânicos e funcionais e conseguiu dar acesso ao grande varejo a várias pequenas empresas. Na linha do fundo compartilhado, tivemos ótimos resultados, montando fundos de microcrédito gerenciados por instituições como o Instituto Socioambiental (ISA), que trabalha no fomento da coleta de sementes para reflorestamento em Mato Grosso.
Grandes empresas também encontram espaço nos projetos do Ventura?
Certamente. Temos, por exemplo, uma parceria de sucesso com a Inaceres, maior empresa comercializadora de palmito cultivado do País. O projeto agrega ao nosso modelo o tão importante aspecto da comercialização, muitas vezes negligenciado no fomento rural. Juntamente com a Inaceres, financiamos a entrada de pequenos agricultores da Bahia em sua rede de fornecedores. A empresa, por sua vez, garantiu a compra do produto a um preço justo. Procuramos replicar o modelo com outras grandes empresas.
Na Amazônia, muitos pequenos produtores de comunidades isoladas não conseguem crédito porque estão na lista suja de inadimplentes, por não terem pago prestações de alguma compra. O Ventura parece tratar o assunto com maior flexibilidade.
Avaliamos as situações caso a caso. Trabalhar em parceria com uma instituição local idônea é chave para o sucesso da aprovação do crédito. No caso do projeto do palmito citado anteriormente, contamos com a experiência da TechnoServe, ONG especialista em levar soluções empresarias ao meio rural. Também estamos em avançadas negociações com a Ouro Verde (beneficiadora e comercializadora de castanha-do-pará). Parceiras locais da empresa nos ajudarão a identificar beneficiários aptos a receber um adiantamento para custear a coleta da castanha.
Também sabemos que pode haver dívidas anteriores e nomes ainda “sujos”. Nos predispomos a humanizar mais o crédito. Quando você dá uma segunda chance a quem mais precisa, os resultados podem surpreender. No projeto do palmito, o reembolso previsto em 2012 era de apenas 5% da dívida, mas os agricultores optaram por reembolsar até 20%, já de olho no financiamento da próxima safra.